terça-feira, 25 de novembro de 2008

O surto

25.11.08 - por Carol Medeiros

Eu não tenho medo de morrer. Tenho muito, mas muito medo é de não viver. Sei que medo é ruim e paralisa a gente, daí o meu medo de ter medo e, consequentemente, de não viver como deveria, ou poderia.

A gente nunca está feliz, sempre já “foi” feliz. Assim, no passado. Olho situações que vivi, tempos que já foram e tenho convicção de que muitas coisas boas já passaram por essa minha vida! Ou eu que passei por montes delas, tanto faz. A sensação é de que daqui a um tempo vou olhar para o passado (que é o meu hoje) e pensar: “Bons tempos!”, embora hoje não tenha tanta certeza de que são tão bons assim!

Às vezes acho que estou ficando louca. Mas se só os loucos são felizes, então eu devia me sentir louca e feliz, em vez de me preocupar quando acho que estou tendo pequenos surtos! Ou não? Argh! Caso de internação, ou crise existencial à vista!

Não tenho medo da morte, mas da ausência da vida. Não gosto de pensar que um dia não vou mais acordar com a Belinha me lambendo. Que não vou mais abrir as cortinas e ver o mar sem nem ter que levantar da cama. Que não vou olhar o despertador e dar um pulo da cama por estar (mais uma vez) atrasada pra fazer um monte de coisas legais, outras nem tanto. Mas que um dia me farão falta, todas elas, algo me diz!

Não gosto de pensar que não vou mais abrir meu armário e ter certeza absoluta de que tenho 543 blusas inúteis, que as calças estão apertadas e que preciso urgentemente comprar sapatos novos, porque não tenho nenhum – NE-NHUM – que preste, incrível!

É chato a beça cogitar que um dia não vou mais comer o empadão da Adriana, nem vou mais ter vontade de comer chocolate de sobremesa. Algum dia não vou mais precisar ir à academia, o que às vezes é um alívio, mas com certeza não vou achar isso no dia em que em que eu quiser ir e simplesmente não puder.

Odeio pensar que todos os dias textos serão escritos por pessoas que escrevem bem melhor do que eu, e que eu não vou ler nenhum deles. Que gênios ganharão o prêmio Nobel e eu não estarei aqui para saber. Que ótimas peças de teatro serão encenadas e péssimos filmes entrarão em cartaz, e eu não poderei criticar nenhum deles, nem pro bem, nem pro mal. Ainda bem que no dia em que esse dia chegar, provavelmente Almodóvar e Woody Allen já não farão mais filmes imperdíveis. Egoísmo, eu sei.

Que chato vai ser no dia em que eu não puder ir pra noitada ou não tiver mais minhas amigas reclamando porque eu não quero ir pra noitada, mas mais estranho será quando eu não tiver mais pra onde ir, e daí não tiver mais dúvidas de que programação escolher.

Vai ser bem esquisito não precisar correr contra o tempo para dar conta de almoçar com uma amiga, trabalhar, checar emails, marcar dermatologista, fazer as unhas e pensar no futuro enquanto dou conta do presente.

Não consigo imaginar o dia em que não vou mais precisar incorporar a psicóloga para ouvir uma amiga. Quando isso acontecer, também não vou mais precisar pagar terapeuta para ouvir meus problemas, em compensação não terei onde gastar a grana que economizar, já que não tendo problemas também não haverá soluções, tampouco válvulas de escape.

Vai ser um bocado estranho não reclamar dos meus pais e não brigar com meus irmãos, nem ter vontade de morar sozinha. Aliás, vai chegar um dia que a última coisa que eu vou querer é ficar sozinha! A Belinha tem que viver para sempre!

Vai ter um dia, tenho certeza, em que não vou ficar angustiada por não saber o que fazer da vida, nem vou me preocupar em ser independente financeiramente. A vontade de ler todos os livros do mundo vai passar, e junto com ela passará a angústia por saber que nunca, de jeito algum, daria mesmo conta disso.

E então vai chegar o dia em que não vou ter mais sensações bizarras, medos nem vontades que eu quero que passem urgentemente. Quase chego a sentir alívio ao constatar que chegará um momento em que todos os problemas do mundo - pelo menos os do meu mundo - terão fim.

Ai, que tranqüilidade chata. Dá até sono. Quero meus problemas de volta.

6 comentários:

Anônimo disse...

Carol,acho q todo mundo surta exatamente desse jeitinho que você descreveu!!!!
Mais uma vez parabéns!

Unknown disse...

Já passei aqui por algumas vezes, quase em todas as vezes q leio seus textos eu te deixo um recadinho em algum lugar para te parabenizar...
E bem, vai parecer repetitivo, mas vc se supera todos os dias e hj não foi diferente ao me deparar com seu novo texto!
Parabéns Carol, fantástico!!!
Não se preocupe com nada disso, sua marca nessa vida vc está deixando agora, tds os dias...a cada novo texto!
Muito sucesso!!! E vamos continuar surtando todos os dias um pouco...
Bjs Thaisinha

Anônimo disse...

Então deixa eu surtar com você, porque que até para essa patologia deve ser horrível não ter com quem dividir, certa vez li em algum lugar, acho que Sócrates, onde ele definia alguns tipos de loucuras. A profética, em que os deuses se comunicariam com os homens através do corpo deles, por minha definição isso é MACUMBA. A ritual, o louco vive o êxtase através de danças e rituais, por minha definição uma RAVE e no final é possuído por uma força exterior (DOCES, BALAS E AFINS). A loucura amorosa, por minha definição VOCÊ, produzida por Afrodite, é a loucura poética, produzida pelas musas.

Elyzia disse...

Carol...cada dia q passa me encanto mais com seus textos...adoro todos eles!!
grand bju

Klara disse...

Ainda bem que quando esse dia chegar - e tomara que demore bastante, a chance de você saber que está perdendo tudo isso, e sentir essa perda, é mínima. E melhor ainda que você dá valor à vida, enquanto vive. bejos

Anônimo disse...

Eu estou passando por esta fase...kkk
De Surto total!
Parabénssss! Adoro seus textos!