quarta-feira, 18 de junho de 2008

Cada um com seu cada um – e as prioridades nas relações


publicado em www.sacoleirachic.com.br em 18.06.08

Por Carol Medeiros

Dia desses assisti a “Sex and the City – o filme”. Antes que os homens que lêem a coluna percam o interesse, aviso que o tema é de grande utilidade para qualquer pessoa, do sexo feminino ou masculino, que já tenha tido, tenha ou pretenda ter um relacionamento com alguém. Sendo ou não fã da série, para quem assistiu ao filme ou pensa que “é coisa de mulherzinha”, recomendo atenção. Afinal, se até a protagonista Carrie Bradshaw pode falar de relacionamentos, eu também posso.

Obviamente fui ao cinema ansiosa para matar as saudades da série que acompanhei por longas seis temporadas – e que acompanho até hoje, diga-se de passagem, vendo e revendo DVDs com todos os capítulos. “Sex and the City” mostra a rotina de quatro mulheres bonitas e bem-sucedidas que moram em Nova Iorque e vivem em busca do amor. Ou seria em busca de sexo? Ou de ambos?

É difícil definir o conceito de uma das séries mais famosas dos últimos tempos, mas garanto que é imperdível por um motivo: apesar de as personagens serem retratadas com exagero, tenho certeza de que todas as mulheres se identificam com um pouco de cada uma delas. É bom esclarecer que não se tratam de mal-amadas desesperadas à procura de maridos (embora, admito, isso aconteça em alguns episódios), mas sim de mulheres com questionamentos pertinentes à realidade da maioria de nós, mesmo daquelas que não tem o armário repleto de sapatos Manolo Blahnik.

Carrie, a personagem principal, é uma escritora que, durante dez anos, vive às indas e vindas com Mr. Big, um charmoso quarentão. Ao longo das seis temporadas do seriado eles terminam e voltam dezenas de vezes, e ele chega a se casar com outra – ainda assim, não consegue ficar sem Carrie. No último episódio do seriado eles se entendem, e decidem morar juntos no filme que está em cartaz nos cinemas.

Até aí, tudo bem. Até que decidem, de um modo peculiar, se casar oficialmente. Carrie compra uma roupa discreta (o que foge à sua regra) e Big sugere uma cerimônia para poucos convidados, o que se torna impossível dada a popularidade da escritora-celebridade. Ocorre que Big, que está no terceiro casamento, acha tudo over, fica confuso e desiste de se casar com a protagonista (quem ainda não viu o filme, não me mate. Podem acreditar que o final não é o que mais importa, mas sim o questionamento que ele suscita).

Big não desiste do casamento porque não quer ficar com Carrie, mas sim porque se sente intimidado, se acovarda. E depois de muito sofrimento de ambos em algumas horas de filme, o casal se reencontra e, desta vez, sem champanhe, festa para 300 convidados e nem vestido de noiva de Vivienne Westwood, ficam juntos pra valer.

Quando o filme acabou, fiquei confusa. Eu imaginava que o casal-sensação terminaria junto, por razões óbvias. Mas depois de acompanhar, com o coração na mão, o sofrimento de Carrie ao longo de seis temporadas, sendo coroado com a desistência de Big na porta da igreja, fiquei pensando se o “happy end” fazia algum sentido. É compreensível a escritora continuar amando Big; a gente não manda no coração nem quando ele é destroçado. Mas vale a pena ficar com alguém tão complicado a ponto de qualquer fator externo o fazer pensar se quer mesmo estar com você?

Voltemos ao dilema da “dose certa”, tema da minha segunda coluna. O filme, os episódios da série e os da vida real, vividos por mim e por zilhões de amigas, evidenciam a dificuldade de, ao gostar de alguém, decidir entre dois caminhos que parecem opostos. Optar pelo caminho do amor, louco amor, aquele que faz o coração bater mais forte, dá frio na barriga, mas também traz complexidades que fazem sofrer, que nos impedem de pensar com a cabeça.

O segundo caminho parece mais tranqüilo e indica uma relação estável e saudável, onde cada um tem vida própria e não há espaço para sentimentos como ciúmes. Dada a ausência de qualquer coisa que fuja à serenidade da relação, não por acaso não há espaço também para um amor arrebatador. Não sei se acredito no “meio do caminho”. Também não sei se, no lugar da Carrie, conseguiria me esquecer de ter sofrido tanto por alguém simplesmente por amá-lo. E não menosprezo o amor, só tenho minhas dúvidas se isso não é amar muito ao outro, mas pouco a si.

O filme nos faz lembrar também que não existe verdade absoluta em relacionamentos. Carrie até queria se casar num vestido suntuoso, mas ficou feliz trajando um tailleur simples e casando-se em cartório. A sensação que dá é que já que não dá pra ter tudo, ela opta por estar com Big em vez de ter a mais bela cerimônia com a qual sonhou. O que vale mais a pena na história deles? Não sei, e provavelmente não é o que mais vale na minha ou na sua. Prioridades, meus caros. Tão complexo quanto na série e no filme. Só que na vida real, não é o diretor quem decide se o final é feliz.

Nota da autora: ainda bem que escrevi a última coluna “Pra não dizer que não falei do Dia dos Namorados” antes de assistir ao filme. Quem for ao cinema vai descobrir que Carrie Bradshaw também concorda que, em relacionamentos, cada casal precisa estabelecer, juntos, suas regrinhas.


email para esta coluna: mariacarolinamedeiros@gmail.com

segunda-feira, 9 de junho de 2008

Pra não dizer que não falei do Dia dos Namorados

publicado em 10.06.08 na coluna Versatilidade Chic - www.sacoleirachic.com.br

por Carol Medeiros
As idéias para escrever a coluna tem sido tantas que sempre fico na dúvida sobre o tema, exceto desta vez. Na semana do Dia dos Namorados, em que a paixão dos casais vira a bola da vez em TODOS os lugares, eu me rendo! Mas vou falar sobre o assunto do meu jeito.

Dia desses encontrei um livro que tenho há séculos. Na verdade, eu o peguei emprestado de uma amiga quando devíamos ter uns 14 anos e gostei tanto que, assumidamente, não devolvi (algo me diz que ela deve achar sábia a máxima “CD e livro não se emprestam”. Enfim.). “100 razões para ficar com ele / 100 razões para livrar-se dele” é o título do livro de Sharon Naylor que, à primeira vista, mais parece uma obra banal de auto-ajuda (confesso que ele não me chamaria atenção em nenhuma livraria), mas sua obviedade se torna interessante na medida em que ele pode ser usado (sugestão minha) como livro de consulta.
Explico: o livro traz, em tópicos, “motivos” para manter ou não um relacionamento amoroso com alguém. E desenrola cada uma dessas razões, defendendo, por exemplo, que devemos nos livrar de um homem quando ele implica com nossas roupas. Segundo a autora, esse comportamento mostra que ele quer tornar a parceira uma marionete particular, e a implicância é só o modo de começar a “puxar as cordinhas”. E não é que ela tem razão?
Sou da teoria que atitudes refletem o caráter. Gestos que parecem bobos podem sinalizar traços da personalidade que desembocam em “razões para ficar com ele” ou, nesse caso, “razões para livrar-se dele”. Exageros à parte, o livro traz dicas bacanas sobre coisas que, às vezes, um coração apaixonado evita, a todo custo, que os olhos enxerguem.
O lado romântico da obra narra 100 razões que fazem de uma pessoa alguém com quem vale a pena ficar. Por exemplo, se seu animal de estimação adora seu namorado é um forte indício de que ele é, de fato, uma boa pessoa. A autora diz que os animais costumam ter percepção afiada para essas coisas, e no caso da minha Belinha, posso dizer que ela sempre acerta.
Mas o que mais me fez pensar relendo o livro foi perceber que nem sempre alguém que tem 99 de 100 razões para “ficar com ele” é alguém com quem, necessariamente, se queira estar. Às vezes o cara tem, sim, muitas qualidades que o tornam o namorado quase-perfeito, mas a perfeição é uma armadilha e cansa. O resultado é uma operação nada matemática onde somadas, as razões que fazem com que alguém “valha a pena ficar” resultam em nada além de pré-requisitos. Claro que “seu pai gostar dele” e “ele não se lamentar da própria infância” colaboram para que uma relação seja legal, mas isso não determina se uma relação vai dar certo. O desafio é descobrir: se não é só isso, o que é, então?
Ninguém sabe o que faz duas pessoas se gostarem. Dizem que a única regra do amor é que não há regras, mas eu discordo. O que não existe é uma regra comum a todos os casais, porque cada um deve estabelecer junto as suas, penso eu. E elas podem soar absurdamente bizarras para outras pessoas, mas às vezes é o que mantém o casal unido e apaixonado, pelo menos enquanto durar. E não é raro algo que seja um pequeno deslize aos olhos de uns significar a separação para outros. Porque para aquelas pessoas (ou, ao menos, para uma delas) havia algo importante ali que não foi “cumprido”. E aí, já viu.
O livro destaca razões para ficar ou não com alguém. Entretanto, não lista o que fazer quando há muitos motivos para não ficar com ele e apenas um que faz com que você queira enormemente fazê-lo, simplesmente porque tem uma coisinha ali que encanta, atrai, comove. Apaixona.
“O coração tem razões que a própria razão desconhece”, disse o filósofo francês Blaise Pascal, que era também físico e, veja só, matemático. Segundo uma busca no não muito confiável mas sempre útil Google, Pascal defendia que o coração era a fonte dos conhecimentos humanos de maior valor, os quais a razão não podia compreender nem justificar. E isso lá pelo século 17! Algo mais atual?

Pouco antes de escrever essa coluna, li um trecho de um poema atribuído a Fernando Pessoa (já disse que não confio muito na autoria do que leio na internet) e morri de vontade de encaixá-lo aqui. Diz assim:


“Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já têm a forma do nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o tempo da travessia, e se não ousarmos fazê-la, teremos ficado, para sempre, à margem de nós mesmos”.

Fiquei pensando em um link entre minha mais nova descoberta poética e o Dia dos Namorados. Daí, percebi que nos relacionamentos quase sempre o novo atua de forma ambígua: atrai e intimida. A gente enjoa da mesmice, mas tem medo de provar o que não conhece. Não quer ir ao mesmo lugar, mas não toma a iniciativa de pegar outro rumo. Dica pro Dia dos Namorados, seja só ou a dois: desfrute da sua companhia e, se for o caso, da do outro, mas estabeleça suas prioridades e razões para ficar com alguém ou se livrar dele. E nunca, por razão nenhuma, permita-se ficar à margem de si mesmo.

segunda-feira, 2 de junho de 2008

O que você vai ser quando crescer?

publicado em 02.06.08 na coluna Versatilidade Chic - www.sacoleirachic.com.br

Por Carol Medeiros

Desde crianças somos perguntados: “o que você quer ser quando crescer?”. Nas redações da escola, nas festas de família, nos encontros com os amigos dos pais, todo mundo quer saber o que pensamos sobre o futuro. E assim vamos sendo treinados pra pensar no longo prazo, pra refletir sobre o que queremos pra nossa vida bem lá longe, quando “formos grandes”.

Curioso é perceber que não são poucas as pessoas que passam a vida inteira tentando, sem sucesso, responder a essa pergunta pra si próprio. E quem não consegue, em geral, se frustra. Tem aqueles pra quem a vida adulta nunca chega. Tem aqueles que crescem, se formam, se tornam profissionais competentes, bem-sucedidos aos olhos dos outros, e nem por isso acreditam ter achado a resposta para “o que vou ser quando crescer”. Outros se cobram tanto sobre o que vão ser que não vivem o presente, e o que é o futuro se não uma sucessão de fatos vividos aqui e agora?

Há também quem saiba o que quer ser desde criança. Esses, normalmente, são “utópicos” ou “cabeça-dura”. Raramente são vistos como seres determinados, que sabem o que querem desde sempre. É mais fácil acreditar que são pessoas que simplesmente não admitem mudar de idéia, que decidiram o que queriam fazer de suas vidas quando crianças e, portanto, não faz sentido manterem a mesma opinião depois de crescerem. Será mesmo que não?

Nos tempos de escola, me lembro que esse era um tema recorrente em redações. Em sala de aula, a resposta para “o que você quer ser quando crescer” costumava vir atrelada a objetivos profissionais. “Quero ser médico pra cuidar das pessoas”, dizia um. “Quero ser advogado como meu pai”, escrevia outro. Não me lembro de ter ouvido em algum dia na infância uma resposta que se parecesse com “quero ser bem resolvida, saudável, saber me relacionar com as pessoas, ser capaz de tomar decisões, saber apreciar um bom vinho, ler bons livros e conhecer o mundo”. Ok, uma criança não diria mesmo isso, mas se dissesse (com exceção do vinho, porque aí eu também me preocuparia), provavelmente seria repreendida pela professora que, partindo da falsa premissa de que “o aluno não entendeu”, explicaria que tipo de resposta era admissível para tal questionamento.

Dia desses, um professor da minha pós-graduação, bem longe dessa época de redações escolares, disse que devemos aprender a “enxergar além, quebrar paradigmas”. Ele usou como exemplo a figura de um vaso branco inserido em um fundo preto. Se olhássemos o fundo em vez de o vaso, víamos duas pessoas, mas é claro que a maioria viu primeiro o vaso, que é o óbvio, o que estamos treinados a ver.

Não sei não, mas acho que há alguma coisa paradoxal nisso tudo. Quando somos crianças faz-se de tudo para que não fujamos a nenhum padrão, sob pena de nos tornarmos adolescentes problemáticos, autistas ou, no mínimo, precoces. Depois que crescemos e, em razão de experiências como a das redações escolares, nos acostumamos a enxergar o que a maioria vê, vem a necessidade de “quebrar paradigmas”. Alguém pode me explicar de que jeito?

Num país onde algumas crianças perdem sua infância nas ruas ou em trabalhos escravos, outras perdem tempo em frente ao computador, literalmente cercadas dentro de condomínios, sob justificativa paterna de que “assim estão seguras”. Que estão relativamente protegidas da violência das cidades, até posso concordar. Mas essas crianças não estão protegidas contra coisas igualmente nocivas, como o conteúdo perturbador da internet e os absurdos da TV. Menos protegidas ainda elas estão de pais e professores que consideram como resposta ideal para “o que eu quero ser quando crescer” qualquer coisa que não fuja à regra, o que, por alguma razão, seria ruim.

O que eu vou ser quando crescer? Não sei. Vou tentar, experimentar, viver. Aí, descubro e venho contar.